Chocolate meio amargo

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E cá está Ulisses novamente, solitário, com os olhos marejados vai pra cama. Dormir? Não. Vai desabafar com seu parceiro leal, seu fiel e velho amigo travesseiro. Ele que mais uma vez vai enxugar suas lágrimas e ouvir seus pensamentos, tão sinceros e feridos.
Pensamentos de quem mais uma vez amou e agora experimenta o gosto mais amargo que um homem pode sentir, a desilusão. Num mundo onde todos pregam a independência emocional, em que o amor perfeito já caiu em desuso, Ulisses é um bobo, fora de moda, que ainda acredita na paixão.
Coitado, perdido nesse mundo ainda sonha em encontrar o famoso "grande amor". E lá vai, sempre na mesma rotina. Se encanta pelo sorriso, papo vai.. papo vem, quando sente pela primeira vez aquele frio na barriga se apavora, tenta com todas as suas forças lutar contra aquilo mas não consegue, se apaixona. Quando vê está ali, entregue, com o coração ofertado na bandeja para a pessoa amada. Conta as horas pra poder ligar, aí, aquela voz que dispara o coração... e ele vai as nuvens. Se rende como um trouxa. Se perde fazendo planos, apostando tudo, sua vida por quem ama. Mais do que o sexo e o tesão, o beijo e o cafuné, aquele que se faz abraçadinho enquanto se diz juras de amor, que ele sempre acredita, é tudo o que ele quer. Impregnado nas suas narinas o perfume de quem ama não sai de sua memória. O sorriso do último encontro e a melodia do "eu te amo" constroem um filme, merecedor do Oscar, em sua cabeça.
E ele acredita, ele ama... da última vez disseram pra ele não ter medo, "vem que eu não vou te machucar". E ele foi.
Mas uma hora sua sina faz valer. Já sem o coração, entregue a outra pessoa, lhe tiram os sentidos. Cego no escuro não encontra mais a quem amou. Da boca que antes saiam as mais doces palavras de amor, agora saem frases de indiferença, o sepulcro de um fim repentino e sem explicações. Pobre Ulisses, se debate, como bom romântico, mesmo certo pede perdão. Pelo quê? Nem ele mesmo sabe. Mas sua amada se vai... esvairesse, e no lugar do coração que um dia lhe fez entregar deixa a dor de mais uma desilusão.
Mas a cama é quente, o travesseiro, como disse, é leal, um dia passa, ou pelo menos tenta acreditar que sim.  Seu amor já não está mais ali, seu beijo, seu carinho, seu sorriso... seu chão. Nosso herói está só e dispensa piedade. Afinal, é um sortudo!
Se amou, amou com intensidade. Se jurou, jurou pela eternidade. Se beijou, foi com o coração. Se chorou foi por sentir saudades... saudades daquele gostinho de paixão sincera. Gosto que só os mais puros amantes sentirão. Não por serem melhores, mas por amarem mais. É preciso ser insano, amar sem razão, sem lucidez.

Mas Ulisses não desanima. Demora, mas aos poucos recupera novamente sua sanidade e feito isso a joga fora de novo. Se arrisca em um novo amor... um dia a sorte vem. Não a dele, mas a de quem perceber que talvez o último romântico esteja só e resolva não mais deixá-lo solto por aí.